quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Texto sem nome (#1) - 29 de agosto de 2013



Todo homem possui um imenso vazio. Condição nata, nos acompanha do primeiro ao último suspiro.  Todo vazio é imenso, todo vazio possui um homem... e jamais será preenchido.

Cientes de nossa condição, tentamos abarrotar e rotular nossas lacunas, e nisso, o homem tenta fazer-se de sexo, amor e (ou) derivados. De bebida, cigarro ou qualquer outro vício. De trabalho, de ócio, de religião, de descrença... a gente tenta preencher a nossa falta, mas sempre falta algo.  A gente tenta rotular o “oco nosso de cada dia”, com a ausência do ente querido, do sucesso profissional, do carro do ano, do cargo da vez, do telefone celular mais moderno... a gente envolve o mundo com as mãos, e o leva para dentro do nosso vazio, dando-lhe formas, cores, cheiros, contornos e histórias. Nele tudo cabe, pois esse é interminável. Mas nem mesmo nossa astuta manobra é capaz de explicá-lo, domá-lo, ou mesmo de atenuá-lo. Então, ouvimos uma canção do Jeff Buckley, a fim de nos encontrarmos... ou nos perdermos.

Dias como este, em que estou na iminência de tornar-me (oficialmente) um ano mais velho, trazem à tona esta ausência.  A ausência que é atraída de forma quase magnética pelas fúteis congratulações de quem é completamente indiferente a mim, ou de quem se importa, mas não sabe a razão de prestar tal homenagem. E por quê prestá-la? Não há mérito em envelhecer, esta é a nossa função. É apenas viver , e só.  É somente um dia comum. Mais um dia de ignorância, indiferença, notificações que não me dizem respeito e, mais do que isso, pessoas que não me dizem respeito. Mais um dia de uma solidão que só se relativiza a meu desfavor.

No início do mês, (por estima), parabenizei um conhecido pelo seu aniversário. Ele estava doente e penava, na busca de atendimento médico. Em poucos minutos de conversa, minha alegria arrefeceu, voltei à realidade e dei-me conta (por mais uma vez) de que a felicidade é um luxo ilusório e que a alegria é para poucos... sempre contrastando com a tristeza, fazendo de nós uma marionete da vida, cujas ações e emoções serão decididas no rolar dos dados. Não é necessário muito tempo para que a dicotomia torne-se clara: regozijo e pesar estão lado a lado.

Antes que eu me despedisse, a última lição daquela noite. O som de tiros me fez lembrar de que a vida está sempre por um fio. Naquele instante, o vazio de alguém se desfazia. Se desfazia também sua existência. Todo vazio se vai, quando vamos com ele.

Dias depois, numa madrugada, novamente o som de tiros me alertava: a morte está por aí, solta, a um palmo de nossos narizes, ainda que mantenhamos os olhos fechados. Ela caminha entre nós, nas ruas, vigiando e arrebatando nossos vazios, que de tão vastos, quando levados, já não deixam coisa alguma.

Me pego escrevendo este texto. O mais do mesmo requentado e cada vez mais insípido. A incontornável presença de minha amargura peculiar e quase ancestral. Papagaios velhos não aprendem truques novos. Talvez eu seja apenas um papagaio velho, resmungão e confuso. Não consigo praticar um truque diferente, por isso, exponho aqui o meu vazio... polido, regado, bem alimentado, exibido numa vitrine, à espera de alguém que o queira comprar.

Quanto a amanhã, darei-me por satisfeito se puder comer uma fatia de bolo, dormir e tiver a sorte (ou a falta dela) de acordar no dia seguinte. O resto é alegoria.


PS: Para poupar-lhes de minha rabugice e minha escrita quase que monotemática, cogito seriamente afastar-me do blog por algum tempo. Se isso de fato ocorrer, volto em breve, volto qualquer dia (ou não volto).



quarta-feira, 21 de agosto de 2013

21 de agosto de 2013 - Meio saudosista, meio mussarela



Há alguns meses fui convidado para uma confraternização que envolveria os meus colegas de ensino médio. Uma reverência ao saudosismo de tempos que já não recordamos com precisão.
Fico admirado com a aura de perfeição que aqueles tempos adquiriram, já que se eu me esforçar um pouco, lembrarei que sofri como um cão, no biênio 2008-2009. Entretanto, foram tantos contos sobre este tempo e tantos pontos aumentados, que minha mente, antes desvairada, deu novas, mais belas e vívidas cores a este período.

Tudo bem, deixemos que essa seja a minha época de ouro. Deixemos que esses sejam os dias que eu me orgulharei em narrar para os netos alheios, ainda que já não possa haver precisão na narrativa, que os fatos já tenham sido mesclados à fantasia e que possam ter perdido os seus reais contornos. Deixemos que essa seja a minha “estória”, pois nenhum tempo áureo está alheio às projeções que lançamos sobre eles.
Essa foi a era em que experimentei a mais avassaladora das paixões e dela, extrai o amargo, que por muito tempo permaneceu em meu paladar. Foi a era dos “babinhas” na quadra de concreto. Da surpreendente convocação para o nosso combalido time de basquete e das nossas vitórias por “W.O.” Foram os tempos do meu cover de Elvis e do meu consequente envolvimento com a música. Dias de aulas gazeadas, de pensamentos distantes.

Eu pertencia a um grupo. Neste grupo não havia um só indivíduo bonito, brilhante, hábil... Nenhum de nós se destacava. Éramos sínteses do indivíduo comum. Rapazes sem muitas qualidades, jogados aos vorazes leões da sociedade, na jaula do ensino médio. Mas resistimos. Juntos, como se formássemos um pelotão, avançamos, e sem perder sequer um soldado, cruzamos a linha e fomos viver nossas vidas. Mantivemos-nos de pé, porque na bolha que criamos nossas deficiências não falavam tão alto. Éramos suficientes.
Cada um dos alunos daquela classe era singular. Em personalidade, em características físicas, em funções sociais... Todos eram absolutamente únicos.

E então, surge essa ideia de que nos confraternizemos. Surge essa ideia de me por frente à minha paixão adolescente, para descobrir que ela engordou uns 20 quilos. De me reapresentar ao sonhador, para constatar que ele largou o violão e tenta mostrar-se satisfeito ao ser explorado cruelmente por uma companhia qualquer, em troca de um ordenado miserável. De abrir meus olhos para a realidade e enxergar os rascunhos toscos que nos tornamos.


Eu agradeço, mas rejeito.  Não permitirei a profanação do passado... Do meu passado. Todos nós seguimos diferentes caminhos e estamos tão distantes uns dos outros, quanto estamos do que éramos. Prefiro manter o que resta da visão dos “anos dourados”, sem confrontá-la com a vil realidade. Prefiro que sejamos o que fomos. Ainda que não o tenhamos sido.


sexta-feira, 9 de agosto de 2013

9 de agosto de 2013 - Entre linhas mal traçadas

Escrevo estas “mal traçadas linhas” porque o tempo avança inclemente e já são quase duas semanas completas num absoluto deserto criativo. São quase duas semanas sem postar um texto que me expresse os pensamentos, são quase duas semanas em que talvez eles não tenham existido.

O compromisso da escrita regular tem o seu cumprimento como uma tarefa cada vez mais penosa. Conforme vão se expondo os vícios, os erros, as falhas e faltas, mais complicado torna-se escrever. Eu tentei inovar e já não me repetir, tentar novas abordagens, novos temas, diferenciar-me de tudo o que tenho feito nos últimos tempos. Porém, o que os últimos dias fizeram parecer, é que sem me repetir, já não sou eu. Não sou nada além de um eco que se propaga, sem que se possa precisar de onde partiu o primeiro grito, de onde surgiu o primeiro som.

Escrevo essas “mal traçadas linhas” porque neste período, tive ideias interessantes, mas que nunca chegaram a evoluir. Sementes que não germinaram, porque lhe faltaram iluminação, umidade e, principalmente, um terreno adequado.  Escrevo linhas tão mal concebidas, porque talvez já não seja capaz de cultivar as minhas ideias como gostaria.

Eu poderia falar de forma profunda a respeito da ação do tempo nas relações, nas pessoas, no mundo que nos cerca. Eu poderia falar sobre como cada um dos meus textos e canções é um pedaço da minha alma, que arranco do meu ser e exponho em praça pública sem saber exatamente o que quero em troca, e o que ganho com isso, é quase sempre uma condição privilegiada para assisti-los perderem-se em murais alheios, sublimados por piadas ruins, euforias incontidas e tantas outras banalidades. Poderia falar de “lições de vida” ou de como minha experiência profissional atual poderia render uma “sitcom” ou algo do tipo. Eu poderia, mas não vou. Hoje, não pareço capaz de produzir algo além de linhas mal traçadas, mal pensadas e mal escritas.


Publico este aglomerado de letras unidas por um mote fraco e sem qualquer objetivo concreto, permeadas por diversos erros gramaticais, porque entre obrigação e capacidade, foi o que consegui extrair. Porque talvez seja hora de assumir a condição que mais me coube na vida: a de autor de coisas tortas.




quinta-feira, 25 de julho de 2013

25 de julho de 2013 - A carta de um homem à beira do abismo de si mesmo


Eu precisava estourar meus miolos. Eu precisava de um choque elétrico. Eu precisava de qualquer coisa que me libertasse a consciência. Que me libertasse, também, dela. Eu precisava falar menos, e encaixar-me em algum canto... Fosse uma caixa, uma gaveta ou um cofre.

Eu precisava desaparecer. Era necessário sentir-se integrado e querido, mas não sem antes, aquietar-me e sumir com qualquer vestígio de uma existência anterior. Eu queria mesmo era esfuziar, e se possível, renascer. Mas para isso, era preciso que nem cinzas restassem. Renascer reformulado era plausível. Ressurgir, não.

Eu precisava escapar do peso de todas as decisões. Das que foram tomadas, das que foram delegadas e das que foram simplesmente ignoradas. Precisava escapar das impossibilidades, das limitações. Precisava desvencilhar-me de uma visão impregnada de cinza.

Eu tinha concluído que a vida, daqui por diante, seria a tentativa de estabelecer um equilíbrio fino entre solidão e companhia. Porém em meio a tanto cansaço, a tanta decepção, a tanto desconsolo e a tanto “não é possível”, era cada vez mais difícil manter a vontade. Manter a vontade pra que?  Por quê? Pra quem?
Daqui por diante, derrota e vitória, alegria e tristeza, sorte e azar, seriam apenas coadjuvantes. O protagonismo estaria reservado à amargura, ao desajuste e ao vazio. Os contrastes seriam meros planos de fundo.

E a mim, restaria prosseguir atormentado pelas vozes que há muito me acompanham. Pela sombra do que fui, pela projeção do que serei e, acima de tudo, pelas idealizações de uma renovação impossível e por um final que embora pareça cada vez mais necessário, não encontra a coragem necessária para se fazer.



terça-feira, 16 de julho de 2013

17 de julho de 2013 - Quebra-cabeça




A sensação é de que falta algo. Não faço ideia do que seja, mas sei que dentre todas as faltas, esta se destaca. É a pródiga, é a peça final.

Como a parte única e ausente de um enorme quebra-cabeça, ela deixa uma lacuna impreenchível, que se ocupada, talvez, explique tudo. Ou nada.

Não está contida nos desamores, na incerteza do sim ou do não, no antes, no agora ou no depois, nas decepções com o ser humano, com a vida ou com a morte. Ausente até nas ausências, ela é a falta das faltas, que não falha em se fazer sentida, mas, é bem provável que jamais tenha sido precisada. Eu sei que ela está lá. Ela faz questão de ser notada, porém, nunca se deixa ver.

Todo dia, minha mente realiza uma busca frenética, procurando em todos os recantos imagináveis, a resposta desse íntimo enigma antigo.

Refaz os passos, retorna algumas horas, relembra o dia, revisa as imagens, pesca cada vez mais fundo, em águas cada vez mais rasas.

Pulando de falha em falha, de falta em falta, da lembrança ao esquecimento, vou avançando e regredindo, em intuito e no tempo, espreitando algo que sempre está um passo à frente. Ou atrás.

Correndo em círculos, numa ação com ares cada vez mais paranoicos e estéreis, eu vou. Vou meio cego, meio cheio de mim. Eu vou, sem ir.

Essa é a minha baleia branca. A estrela que devo apanhar, do céu. A caça de uma vida. E alternando entre estratégia e instinto, entre suposições e ataques, permito que a caça me acosse e que assuma, ela, o papel de caçador.

E dia após dia, no ápice de um novo episódio deste conto ordinário, emerge do breu, o sono. E me acorda da realidade, para me por a dormir. 




sábado, 6 de julho de 2013

6 de julho de 2013 - Viver menos














Acabei de completar uma semana em meu novo trabalho. Depois que a minha rotina sofreu esta mudança, eu tenho tido pouco tempo livre e esta é uma situação muito pouco familiar. Sempre estive acostumado a ter muito tempo. Viver pouco e aos poucos.

Não acho que possa reclamar do meu ofício. Trabalho perto de casa, com algo que gosto.  A atividade certamente não tem o prestígio e a ludicidade de tantas outras, mas é real, é tangível, é rentável, não acho que eu possa esperar muito mais.

Mas à noite... à noite, eu tenho que viver. Eu, que estava acostumado a espalhar meus afazeres em pontos esparsos do meu tempo, vejo-me obrigado a condicionar tudo o que tenho de mais importante a pensar(ou não pensar) e(ou) a fazer, em um curto período. É a vida comprimida. É a vida em comprimidos para dormir.

Essa ideia de reunir tudo num curto espaço, é meio assustadora para mim. Quando me dou conta, é tarde, passei muito tempo ponderando, ou simplesmente o deixei passar. É hora de dormir. É hora de repousar, juntamente com todos os desejos antigos e contidos, com todas as neuroses, com todas as insatisfações, com todas as falhas, ausências... com a atenção quase que inteiramente voltada ao novo cargo, com o temor de que logo ele se afaste. Eu e todas as minhas usuais companhias, vamos repousar , para no dia seguinte, após 6 ou 7 horas de sono, acordarmos, preguiçosos e caminharmos emparelhados, numa recém adquirida jornada.

Meus desgostos são altamente fiéis. Não me abandonam nem mesmo durante a labuta.

A solidão é a mesma, as decepções que eu continuo tentando atenuar com indiferença, também. Eu já não tento falar e ninguém demonstra interesse em fazê-lo. Talvez seja melhor desta forma. Solidão não se vive a dois.

Entre as longas horas de obrigação, que se alastram pelos meus dias, sem serem mais inúteis que as longas horas de ócio as quais eu me reservava, vou me dando conta do real motivador desta inquietação que me impede de aproveitar efetivamente as poucas horas livres que tenho.

A vida é veneno para mim. Para todos, se analisarmos bem a situação. Há quem não concorde, mas, é o que penso. E não sinta pena, caro leitor. Não sinta coisa alguma, eu me acostumei com a situação. Mesmo com este corpo e com esta mente fodidos, eu gosto de estar vivo. Talvez eu seja uma espécie de ermitão moderno, trancado no meu quarto, fugindo de meus semelhantes... mas, eles são tão diferentes, tão superiores... que diabos eu faria no meio deles?

Não é uma forma convencional de viver, mas é a minha maneira.  É a forma que encontrei para não pirar. Para alguns, sobreviver, é a saída. Mais do que isso, é martírio, é auto-flagelo.

Ciente do veneno que me é administrado em doses diárias, contido em cada segundo experimentado, percebi ter duas opções: partir de pronto, ou tomar doses cotidianas do meu algoz. Optei(obviamente) pela segunda. E cada pensamento, cada gesto, cada decisão, é um pouco de veneno que eu ingiro.

Talvez por isso, eu estivesse acostumado a fazer tão pouco. Administrava-me doses minimas e espaçadas, o suficiente para um equilíbrio saudável entre o viver e a inevitável abrasão mental e cronológica.

Mas agora, no novo contexto, com tão pouca disponibilidade, eu faço tudo em pouco tempo. Tudo ao mesmo tempo. Me injeto doses cavalares, em todo período de folga.

Me dei conta do que me assusta. Do que me impede de como os outros, gerenciar meu tempo de forma saudável. Me dei conta da razão de estar ainda mais confuso.

É toda essa vida concentrada, injetada na veia. É viver muito, em pouco tempo. É viver demais esse desgaste, esse desgosto, essa peçonha.

Quem me dera viver menos.


sexta-feira, 28 de junho de 2013

28 de junho de 2013 - Abra os olhos






Eu tentei te avisar. Todos tentaram. Pelo menos é o que eu acho. Mas você não ouviria. Você nunca ouvia, cara! Com sua mente sempre fugindo para refúgios distantes, onde só você podia adentrar, ficava difícil te mostrar, te dizer que havia uma enorme cilada à frente.

Era cilada, porra! Você não acordou. Preferiu levar a vida num misto de narcolepsia e sonambulismo. De jeitos diferentes, por motivos distintos e, cada vez mais.

Uma verdadeira sinuca de bico. Nascimento como uma sentença de morte e um caminho absurdamente sinuoso a percorrer. E você dormia. Enquanto o tempo passava, você ganhava consciência do contexto em que estava, mas acreditava que fazendo a jogada certa, que bailando desacordado em meio às pessoas, você conseguiria vencer. Conseguiria partir sem ter feito muito, sem ter muito a perder. Era uma bela estratégia:  adiar a vida em sono, até o dia em que não mais acordasse.

Era louvável, meu amigo! Mas, olha pra você agora! Quem te vê, enxerga na sua face a representação do fracasso. Sucesso, fracasso, essas coisas são transitórias, são limitadas. Se não fossem tantas as pessoas ao seu redor, talvez, isso sequer  te importasse. E, lembra? Você nunca se deu muito bem com essas pessoas, porém, ainda assim, elas estão pesando na tua balança, e teu fracasso... teu “você”, te doem na carne e na alma.

Você, hoje, tão orgulhoso do “seu” ateísmo, devora insanamente, o pão que o diabo amassou. Desesperado, o plano não deu certo. Se assusta com tanta gente melhor, superior, tanta gente de verdade. Com tantos caminhos a seguir, preferiu não seguir caminho algum. Agora tá velho, e há um exército de gente mais nova, fazendo as coisas que você mais quis, muito melhor do que você jamais conseguirá.

Jogado para fora do teu leito, socado nos dentes e no estômago pela vida. A luz solar cega teus olhos e queima a tua pele. Ela, a vida, te conclama... melhor, te força, a irremediavelmente atrofiado e incapaz, agir, levantar-se do chão e caminhar desperto, até o fim dos seus dias. Já não dá para adiar.

Eu lamento. Quem dera, você tivesse escutado.