Todo homem possui um imenso vazio. Condição nata, nos
acompanha do primeiro ao último suspiro.
Todo vazio é imenso, todo vazio possui um homem... e jamais será
preenchido.
Cientes de nossa condição, tentamos abarrotar e rotular
nossas lacunas, e nisso, o homem tenta fazer-se de sexo, amor e (ou) derivados.
De bebida, cigarro ou qualquer outro vício. De trabalho, de ócio, de religião,
de descrença... a gente tenta preencher a nossa falta, mas sempre falta algo. A gente tenta rotular o “oco nosso de cada
dia”, com a ausência do ente querido, do sucesso profissional, do carro do ano,
do cargo da vez, do telefone celular mais moderno... a gente envolve o mundo com
as mãos, e o leva para dentro do nosso vazio, dando-lhe formas, cores, cheiros,
contornos e histórias. Nele tudo cabe, pois esse é interminável. Mas nem mesmo
nossa astuta manobra é capaz de explicá-lo, domá-lo, ou mesmo de atenuá-lo.
Então, ouvimos uma canção do Jeff Buckley, a fim de nos encontrarmos... ou nos perdermos.
Dias como este, em que estou na iminência de tornar-me
(oficialmente) um ano mais velho, trazem à tona esta ausência. A ausência que é atraída de forma quase
magnética pelas fúteis congratulações de quem é completamente indiferente a
mim, ou de quem se importa, mas não sabe a razão de prestar tal homenagem. E por
quê prestá-la? Não há mérito em envelhecer, esta é a nossa função. É apenas
viver , e só. É somente um dia comum. Mais um
dia de ignorância, indiferença, notificações que não me dizem respeito e, mais
do que isso, pessoas que não me dizem respeito. Mais um dia de uma solidão que
só se relativiza a meu desfavor.
No início do mês, (por estima), parabenizei um conhecido
pelo seu aniversário. Ele estava doente e penava, na busca de atendimento médico.
Em poucos minutos de conversa, minha alegria arrefeceu, voltei à realidade e
dei-me conta (por mais uma vez) de que a felicidade é um luxo ilusório e que a
alegria é para poucos... sempre contrastando com a tristeza, fazendo de nós uma
marionete da vida, cujas ações e emoções serão decididas no rolar dos dados.
Não é necessário muito tempo para que a dicotomia torne-se clara: regozijo e
pesar estão lado a lado.
Antes que eu me despedisse, a última lição daquela noite. O
som de tiros me fez lembrar de que a vida está sempre por um fio. Naquele
instante, o vazio de alguém se desfazia. Se desfazia também sua existência.
Todo vazio se vai, quando vamos com ele.
Dias depois, numa madrugada, novamente o som de tiros me alertava:
a morte está por aí, solta, a um palmo de nossos narizes, ainda que mantenhamos
os olhos fechados. Ela caminha entre nós, nas ruas, vigiando e arrebatando
nossos vazios, que de tão vastos, quando levados, já não deixam coisa alguma.
Me pego escrevendo este texto. O mais do mesmo requentado e
cada vez mais insípido. A incontornável presença de minha amargura peculiar e quase ancestral. Papagaios velhos
não aprendem truques novos. Talvez eu seja apenas um papagaio velho, resmungão
e confuso. Não consigo praticar um truque diferente, por isso, exponho aqui o
meu vazio... polido, regado, bem alimentado, exibido numa vitrine, à espera de
alguém que o queira comprar.
Quanto a amanhã, darei-me por satisfeito se puder comer uma
fatia de bolo, dormir e tiver a sorte (ou a falta dela) de acordar no dia
seguinte. O resto é alegoria.
PS: Para poupar-lhes de minha rabugice e minha escrita quase
que monotemática, cogito seriamente afastar-me do blog por algum tempo. Se isso
de fato ocorrer, volto em breve, volto qualquer dia (ou não volto).